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O objectivo deste blog é duplo, dar a conhecer Pereiros de Ansiães, a sua história, a sua paisagem, o seu património e as suas tradições; é também uma forma de fazer aquilo que eu gosto, de partilhar emoções e memórias.

quinta-feira, 26 de agosto de 2010

Amoreiras para a produção de seda

Existem actualmente algumas dezenas de amoreiras de amoras pretas nos Pereiros. Se olharmos com alguma atenção vemos que estão um pouco por todo o lado: foram plantadas muito próximo das casas, nos quintais e "enchidos", junto dos ribeiros, ou seja, onde facilmente se podia ter acesso a elas. Nestas plantações relegaram-nas para junto dos caminhos, das paredes ou cantos de forma a não afectarem o cultivo das hortas e de outras produções agrícolas. Encostadas a um canto mas numerosas e importantes. Estas amoreiras serviram durante muitos anos para a produção de folha para alimentar o bicho da seda e, consequentemente, produzir casulos donde se extraía o fio de seda. Esta actividade chamava-se e chama-se sericicultura.

A produção de casulos do bicho da seda e de tecidos de seda foi, ao longo do século XVIII e XIX, uma das principais riquezas de Trás-os-Montes. Estes tecidos finos eram depois vendidos para todo o país, para a nossa colónia do Brasil e para outros países da Europa, onde se tornou famosa. (com a fuga da família real portuguesa e de parte da corte para o Brasil, em 1807, na sequência das invasões francesas, foi aí introduzida a sericicultura. Hoje o Brasil é um dos maiores produtores mundiais de seda) Adiante será publicado um pequeno artigo sobre a História da seda em Trás-os-Montes e o ciclo do bicho da seda.Pereiros também participou neste desenvolvimento da sericicultura que atingiu o seu apogeu no século XVIII.
Actualmente, o que restou foram estas amoreiras pretas e a toponímia, os nomes dos caminhos onde foram plantadas. Por isso, é que as pessoas chamam a alguns lugares "moreiras" ou amoreiras. Na fotografia, no caminho das"moreiras" que vai para a "Comprada" e o campo de futebol, encontramos esta amoreira pendurada na parede. Ao lado dela, está cortado para lenha, o tronco de outra amoreira que se pendurava no mesmo local.
O problema com estas amoreiras é que elas perderam o seu papel principal, a produção de folha para o bicho da seda. As suas amoras, apesar de algumas pessoas as comerem e se poder fazer compota, são pouco saborosas e digestivas. Quem arrisca comer estas amoras fica com os dentes e os lábios pintados, por isso, quando eu era rapaz as usava para pintar nas pedras. A outra razão para não se poderem comer está na pequena ficha científica que transcrevi em baixo - são um laxante poderoso. Nem os pássaros parecem ser grandes apreciadores deste fruto caso contrário não se acumulavam em tamanha quantidade no chão.

Amoreiras em terras do Eng. Faria ao lado do caminho com o nome de "Moreiras"

Ao longo do caminho das "moreiras" podemos encontrar amoreiras nos terrenos que pertenceram ou pertencem ao sr. Eng. Faria. Algumas destas amoreiras nem parecem ser muito velhas quando comparadas com outras. A razão é muito simples: várias pessoas ainda se lembram da criação de bicho da seda na "casa da aula" da D. Elisa Trigo, ou seja, a mãe de D. Maria Augusta casada com o Eng. Faria. Esta criação do bicho da seda ainda se fazia há 63 ou 64 anos. A antiga "casa da aula" fica próxima da casa da D. Elisa, em frente à actual casa de Álvaro Borges. Quem, nessa altura, alimentava e tratava dos bichos da seda era a sra. Maria Barreiras e a sua filha Fernanda Barreiras. Segundo alguns testemunhos a sala estava completamente cheia de bichos da seda.
Também a sra. Eulália Moreira confirmou que a sua mãe, Maria dos Ramos, criava bichos da seda, na sala de sua casa, onde eles moram actualmente. Esta criação terá ocorrido há mais ou menos 68 anos.

A casa Caiado Ferrão também tem algumas amoreiras nas suas propriedades, como por exemplo a da fotografia anterior, no Barreiro. Segundo o meu avô, Adelino Pinheiro, os Caiado também criavam bicho da seda. Existem várias amoreiras plantadas ao longo do ribeiro das Olgas.

Estas amoreiras próximas da casa Caiado são de grandes dimensões o que mostra a antiguidade da sua plantação. O meu avô chegou a referir o local onde se fazia a produção intensiva do bicho da seda mas perdi essa memória. Esta amoreira ao lado do caminho do "Barro" tem um tronco imponente. Será que alguém ainda se lembra do local onde os Caiado produziam o bicho da seda? Será que havia outras famílias a criar bichos da seda?

Amoreira situada em frente ao solar dos Caiado ao lado do caminho.



AMOREIRAS


Nome Científico: Morus celsa alba e Morus celsa nigra / Família Moráceas
Origem: A amoreira tipo alba é originária da China. A tipo nigra é de origem persa.
Partes usadas: Folhas e frutos.

Características e Cultivo: Árvore que atinge de 2,00 (alba) a 10,00 (nigra) metros, tronco verrugoso, folhas ovaladas, lisas, verdes brilhantes, dão frutos d
oces, comestíveis, que amadurecem no verão. Dá-se bem em regiões com muito sol, e aguenta Invernos rigorosos.
Propriedades medicinais: Propriedades laxativas e expectorantes.
Laxante simples: comer os frutos lavados de manhã em jejum. Bom para inflamações de garganta e da boca. Fazer bochechos e gargarejos com o sumo fresco dos frutos.




Existem dois tipos de amoreiras: a chamada amoreira preta, como estas de Pereiros, com amoras vermelhas e pretas e as chamadas amoreiras brancas. (imagem do lado direito)
Amora-preta é por dentro vermelho-escura e negra por fora, ao contrário das amoras brancas que tem a cor mais rosada. A amoreira branca também servia para a criação do bicho da seda, tem as folhas mais macias e, durante o século XIX, substituiu com vantagem a amoreira preta. Apenas conheci uma amoreira branca em Pereiros, no quintal do meu tio João Baptista Pinheiro, era de pequenas dimensões, as amoras eram brancas rosadas, muito doces e mais comestíveis do que as pretas. As folhas eram realmente muito parecidas com as da imagem. Chamavam-lhe amoreira da Índia. Esta amoreira já secou há alguns anos. Será que era um exemplar desta espécie?

Amoreira preta - frutos

Ao consultar alguma bibliografia sobre a História da seda em Trás-os-Montes, como por exemplo, o Professor Fernando de Sousa da Faculdade de Letras da Universidade do Porto, no seu trabalho, A Indústria das Sedas em Trás-os-Montes (1790-1820) e o Abade de Baçal nas suas Memórias Arqueológico-Históricas do Distrito de Bragança, ambos dão os finais do século XIX, tendência já verificada a partir de 1820, como o declínio e quase abandono da produção de seda em Trás-os-Montes. Os Pereiros aguentaram-se até à década de 40 do século XX!

A produção de fio de seda era um processo complexo, por isso, não era feito localmente. Os produtores produziam apenas os casulos que depois vendiam. Contudo, todo o processo, desde a produção de casulos, fiação e fabrico de panos era feito em Trás-os-Montes.


As amoreiras tiveram um papel importante na economia de Pereiros durante muitos anos. Podem as suas amoras não ser muito agradáveis ao paladar mas são um símbolo de uma época, não vamos transformar todos os seus troncos em lenha! Tem havido em Trás-os-montes um esforço de preservação desta memória.
Dos quatro maiores focos de produção dessa época - o Real Filatório de Chacim, Estação de Sericultura de Mirandela, as fábricas de Bragança e os Viveiros e Fábricas de Freixo de Espada à Cinta, todos têm tentado manter esta tradição.
Em Chacim, foi feito um levantamento arqueológico e preservado o edifício do Real Filatório; em Mirandela manteve-se a memória na toponímica de uma avenida onde foram plantadas amoreiras; (dão imenso trabalho todos os anos na poda e na limpeza da avenida) Em Bragança, através do seu Centro de Ciência Viva, mantém o espaço da Casa da Seda, num antigo moinho de tingimento da seda onde guarda a memória de todo o ciclo da seda; Em Freixo de Espada à Cinta mantém-se o ciclo completo, ainda se produzem, de forma artesanal, tecidos de seda.

Em Pereiros, o objectivo final era este: casulos de seda.

VAMOS CONSERVAR AS NOSSAS AMOREIRAS



2 comentários:

  1. Estimados Srs,

    Gostaria de saber se têm casulos de seda, ou algum museu onde se se possa ver este processo ao vivo.

    Urgente!

    Como posso entrar em contacto convosco? têm email?


    Obrigada!

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  2. Pode ver todo processo de produção de seda no Centro de Ciência Viva de Bragança. (centro museológico) ou no único lugar onde se produz e comercializa artesanato de seda:
    Podem ser contactados pela Net.
    Associação para o Estudo, Defesa e Promoção do Artesanato de Freixo de Espada à Cinta (AEDPA).

    Um abraço

    Hernâni

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