BEM – VINDO
O objectivo deste blog é duplo, dar a conhecer Pereiros de Ansiães, a sua história, a sua paisagem, o seu património e as suas tradições; é também uma forma de fazer aquilo que eu gosto, de partilhar emoções e memórias.

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

O MOINHO DOS ALVARIANOS


O moinho faz parte de um percurso de final de Dezembro, daqueles dias de invernada em que choveu muito durante a noite mas o dia, apesar das ameaças, vai dando alguma trégua. Enquanto na aldeia toda a gente pensa na campanha da azeitona, depois de quase um mês a chover, fui ver as oliveiras. Apenas ver.  Está um dia macio, quase temperado para a época do ano. Há água por todo o lado. É uma boa ocasião para tomar o caminho da Regadia e ver o Ribeiro.


Este ribeiro recolhe a água de vários outros que descem dos Grichos, dos Carvalhais e dos Termos. Passa por baixo da ponte das Olgas, descansa até aos Moinhos e, depois, precipita-se numa correria desenfreada pela Regadia abaixo até aos Alvarianos. Vai mudando de nome conforme as propriedades que o rodeiam ou dos antigos moinhos que dele dependiam.
Não dá como não o encontrar! Faz-se anunciar bem cedo quando nos aproximamos deste vale profundo e quase incessível. Ouve-se ao longe! Numa trovoada de água e espuma, atira-se ao granito, salta de fraga em fraga, desaparece no meio de grandes penedos para reaparecer depois, escorregando ao longo de  lages maciças e quedas de água. 


Não admira que tenham construído moinhos ao longo do seu curso. Um cheiro intenso a terra molhada mostra que, tudo aquilo que a natureza dá, também acaba por levar.

Correndo por entre escarpas de um
Olha em frente na direcção da serra, ainda há muito para correr, mais selvagem, mais granito, mais vinhas em socalcos e olivais que lhe apertam a margem, ainda faltam os Alvarianos, o moinho, a ribeira e o rio Tua e o Douro, o mar.

Sentado aqui na beira do caminho faz-me lembrar Miguel Torga e o Seu Reino Maravilhoso, vou apenas citar um bocadinho, quando descer ao rio vou ilustrar o seu texto.
"Léguas e léguas de chão raivoso, contorcido, queimado por um sol de fogo ou por um frio de neve. Serras sobrepostas a serras. Montanhas paralelas a montanhas. Nos intervalos, apertados entre os rios de água cristalina, cantantes, a matar a sede de tanta angústia. E de quando em quando, oásis da inquietação que fez tais rugas geológicas, um vale imenso, dum húmus puro, onde a vista descansa da agressão das penedias. Mas novamente o granito protesta. Norda para a força medular de tudo. E são outra vez serras, até perder de vista." 
As serras a perder de vista são as Cortiçadas, a Serra Tinta, o Zambulhal de Abreiro ou a Serra dos Passos. Então... e o nosso moinho? Está lá baixo, escondido entre sobreiros e carvalhos, encostado em cima dos fragoredos do ribeiro. Entretanto o ribeiro calou-se neste espaço
aberto, corre rápido pelos lameiros mas ... silencioso, integrou-se com respeito na paisagem.


Ele aí está! Mais granito, mais fragas, mais cascatas, outra corrida, outra viagem! fizeram-no aqui, à espera do ribeiro, não o invadiu, encostou-se apenas a uma distância segura no seu leito. Atrás dele um maciço imponente, a Pena.


Simples, rústico, telúrico, granito como tudo o resto, nem uma única abertura para entrar a luz, apenas uma porta e aquela boca escancarada para descarregar a água.                                       
 







A mó está lá, intacta, escorada em cima de grandes pedras de cantaria. No chão os restos da antiga roda de madeira que fazia girar a mó. 
Para compreender o engenho e a argúcia de quem construiu este moinho é preciso subir até ao telhado, visto de cima parece que se agiganta, já não se encostou à margem, pendurou-se em cima do ribeiro, dominou-o. 



Na ombreira da porta está gravada na pedra uma inscrição, se as donas não souberam dizer-me o seu significado eu também não vou arriscar!
  
Ainda há um ditado popular que diz que não se deve começar uma casa pelo telhado! O moinho dos Alvarianos ou do Ribeiro das Lajes começou a ser "construído" pelo telhado na cabeça de quem o imaginou. O seu segredo está no canal da água, na forma como foi aproveitada a gravidade. A água do ribeiro foi desviada a montante e, usando um declive acentuado, canalizada a alta velocidade para dentro do moinho. Pelo telhado até ao chão!


Por fora o canal transforma-se num tubo redondo, finamente esculpido em grandes lages de granito e desaparece no interior do moinho. No interior o canal de pedra desce pela parede atravessa o moinho e leva a água directamente para a roda. Um trabalho de mestre. o moinho tem algum feno e pedaços de madeira, o telhado mantém-se num equilíbrio difícil. merecia ser completamente limpo e a água a circular. Quem, há tantos anos, o imaginou, construiu e nele trabalhou, mereciam essa consideração. Se for necessário eu dou uma ajuda.

Um último
olhar para o ribeiro, os Alvarianos, as oliveiras e o moinho ficaram para trás. Este ano, da maneira que está o tempo, muita azeitona vai ficar na terra. Apesar de "depois do Natal o salto de um pardal" os dias ainda são curtos.


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